Olhos cerrados

Passeei lentamente sobre os teus escombros. 
Era um final de tarde apesar do silêncio das cega-regas. 
Ouviam-se rumores ao longe na estrada,
 trilhados entre os restos de chuva e os candeeiros de fruta-luz já madura. 
Os cães não se distinguiam das sombras - mas estavam lá, estancados por detrás daquele olhar fixo e impenetrável dos animais criados pela chuva e pelos restos.
Passeei lentamente pelos teus escombros. 
Tinha a ideia estremunhada de haver pensado o impensável, 
desperta por uma sensação de arrepio como se fosse vidro húmido ao vento. 
O Inverno tem este jeito de fundir as sombras todas debaixo do mesmo frio e de as apertar contra os muros e os telhados.
Passeei lentamente sobre os teus escombros. 
Demorei-me sobre as tuas vértebras arquejadas enquanto as minhas mãos colhiam os teus seios deixados à solta. 
Mordi-te os ombros e os meus dentes foram, por momentos, os cárceres da tua Primavera de desejos e do teu Verão de abandonos.

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