Oxalá

Nada nesse sítio tem nada de mim. Quis pensar que, onde quer que estivesse, talvez houvesse algo que te fizesse lembrar. Mas não consegui..

Tenho a praia, o lugar que deixou de o ser quando se transformou em tempo e onde pisar-lhe o chão é percorrer os segundos de todos os dias e de todas as noites,
na direcção contrária à dos ponteiros do relógio rumo às horas que foram nossas,
só nossas,
até deixarem outra vez de o ser..

e então regressar de mãos ocas mas ainda assim cautelosas, com medo de perder para sempre o que não trazem.

Leio as cartas todas as noites,procurando nas letras o que outros procuram nas estrelas:
o caminho mais belo até ti.

Sei bem que nascemos em hemisférios distintos pontuados de constelações diferentes e que assim que perder as margens de vista, me posso perder desse caminho.Mas há que tempos que estou para te escrever.. tempo demais. Tempo que perdi a imaginar palavras tuas para depois as arrumar algures entre nós dois, num lugar onde talvez o tempo não exista,
num lugar que talvez também ele não exista,
mas que eu saberei sempre como encontrar enquanto conseguir sonhar.

E sim, confesso que sentado na praia da minha infância com os pés a rasarem a àgua,
todas estas pedras que atiro ao mar são a esperança de conseguires ver as ondas que levantam daí desse lado.
Mas são pequenas as pedras ainda que sejam vastas as intenções,
e pouca a força, cansado que estou de me conter,
e talvez as minhas ondas se diluam imperceptivelmente nas do mar..
Mas o sentimento é um menino que não sabe nada do tamanho das pedras, da força do arremesso ou da intensidade das ondas
e por isso passa horas a jogar pedras ao mar,
até alguém o chamar a dizer que são horas
e ele lhe reconhecer a voz.

Ou então dirá:

Já vou....

Mas ficará ali com os olhos transbordando de âncoras que o manterão lá
mesmo quando o levarem embora.

Sim, também espero que encontres o teu caminho.
Mas anseio tão vorazmente que o teu caminho te traga,
a ti e ao teu sorriso,
até à distância de um braço meu
e poder deixar a gravidade natural dos corpos fazer de ti a minha constelação
o meu firmamento
e o meu paraíso pagão onde árvores de louro se transformarão em ti, e nunca o contrário...

Traz-me essa flor que usas atravessada na entrada dos teus lábios como se fosse a coisa mais natural do mundo e eu levar-te-ei ao lugar entre nós dois que só existirá se eu despertar entre os teus braços e mostrar-te-ei o menino que só podes imaginar daí se compreenderes o rumor das ondas mais secretas..

Ele reconhecerá a tua voz, serão os melhores amigos do mundo e poderás finalmente soltar essa flor de Verão no mar dos seus olhos porque todos esses adornos serão supérfluos,
mesmo que não os consigam evitar
quando segurarem nas mãos as palmas repletas um do outro.
Oxalá encontres o caminho.

Oxalá...



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